sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Gula vã

Quem se empanturra
de vazio
arrota vento

Depois
de toda gulodice
frustrar o sentimento

sábado, 14 de agosto de 2010

Fim

A expulsão é mesmo coisa muito violenta, entendo quem quer tratar com carinho a quem tanto quer bem.
Entendo quem abre a porta de si e deixa-a aberta, mas não a convida a entrar, não oferece um café, não pede pra que sente. Entendo quem te deixa desconfortável em uma sala cheia de fotos inexplicáveis, e mesmo te percebendo se perguntando sobre elas, te olha (nunca nos olhos) como quem não quer responder a essas perguntas.
Há quem sentaria no sofá, abriria a geladeira, falaria alto, colocaria os pés no centro, perguntaria sobre as fotos num risinho maroto.
Eu sou quem tiro os sapatos na porta pra não sujar o carpete, quem entende o clima e quem sai, mesmo sentindo muito, mesmo que com interrogações.
Nem todo mundo terá sempre palavras concretas pra os seus ouvidos. Essa concretude da qual precisamos é mesmo muito inconcreta. Tentar várias vezes e saber-se não idiota é diferente de o ser, é diferente de sentar e não se perceber inconveniente. É querer e tentar mostrar sua concretude mínima ao outro, é calçar os sapatos, encostar a porta, ir embora e ligar quando chegar em casa, pra ir sentindo sempre mais o fim. Porque chega. Cedo ou tarde, com mais ou menos dor.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Amores serão sempre amáveis

Se já disse Chico Buarque,
que “amores serão sempre amáveis”,
deve haver muitos amantes amando,
como se fossem infindáveis,
com os meus amores deixados - embora contra a vontade,
no canto de uma estante, nas ruas da cidade,
completamente cansados, não pela idade,
mas por percorrerem mil caminhos, todos eles inviáveis.

terça-feira, 16 de março de 2010

DORmente

aDORa a dor
e diz que está bem, indolor
hermeticamente fechado
pro mundo
e se mantém calado
infecundo.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Medida da taça

Não exagere. E também não aja como quem crê já saber o fim do livro. Quem sabe ele termine antes do esperado, ou depois. Se guiar pelo número de páginas pode ser traiçoeiro.
Bem que você poderia saber mais de mim. Na casa que me guarda existem algumas portas emperradas. Nem ouse chutá-las. Use as janelas.
O querer fazer tudo certo faz com que a gente faça meio errado.
A distância quando é pouca, falta; quando é muita, é demais e estraga.
Quanto à distância, pode agir como quem crê já saber o fim do livro. A aproximação é que deve ser exagerada. Taça de champagne esborrando a espuma.
Certas doses tem de ser homeopáticas e a não existência de receitas clama o uso da taça da cabeça.
Só tenha medo de ser expulso de mim pelo piscar do meu olho, como pálpebra que esquece a luz.
Mas se isso acontecer é porque agiu pequeno, cisco que incomoda.
É aí que o final do livro - que eu alertei para que não previsse - chega antes do esperado.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Alquimia

A vida não tem pena.
E voa.
Voa com o tempo, alquimia da cura.
Queima e dissolve a fumaça,
Faz cicatrizes nos cortes,
E outras façanhas.