terça-feira, 31 de março de 2009

Vermelho-coração.

Eu não vou mais gritar, esses meus ouvidos não me ouvem. Esses sorrisos que me chegam são longos e a barra do dia sempre me diz que talvez nem tenha sido importante o sonho da noite, mas o sonho de todos os dias precisa ir além; que o pé nem sempre precisa estar todo no chão; que a coragem nem precisa ser exorbitante, mas a cara tem que estar junto dela; que o gosto acre na boca e o asco que dá de você mesmo nunca vão me deixar a sós; que até o espelho que já não agüenta mais aquele olho baixo de revés e um cabelo que sente nunca está ajeitado podem me desamparar. Mas não é novela, não é filme de romance e agindo como se fôssemos uns personages-marionetes-imbecis nos subornamos disfarçados de nós mesmos. Curvas bruscas no meio de um caminho de flores. E o vermelho da flor, que também é do morango e do sangue, como também é da vida e também da morte se confunde. São estes traiçoeiros tambéns que desmistifica certezas. Mas um coração que pulsa vermelho talvez tenha a resposta, ou não, pra todos esses terrores e todo esse embaçado de cores.

Cantata

Barulho de chuva, respiração perto, aragem que se aninha entre as faces, barba e franja nos rostos, sombras e sussurros e sorrisos e cheiros e perfume de pele, mão que tateia, sobe e desce de nenhum som, vai e volta de nada. Paira tudo e alguma coisa mais, turbilham pensamentos, pele que não é casaco, envolve e não é lençol. Gosto de café e de beijo. Beijo da noite, madrugada e manhã. E não há o que procurar e o que entender. A fumarada do tabaco que leve qualquer espécime de incerteza e medo. As paredes, o teto e o escuro que desgastem o sorriso tímido e o excessivo pudor. Que a boca não pergunte se deve, que o coração não acerte se é paixão de “borboletas no estômago”, que o acaso tome conta e que ninguém saiba, só eu ou só nós, ou ninguém. É como falar de um duo para si e não existir palavra que conceitue esse falar. Se pra um é como borboletearem suas vísceras, pra outro talvez seja como zabumbarem o seu peito, e sua boca se encher de sorrisos parvos e seu corpo desmanchar-se em gestos tímidos.

(Domingo, 01 de março de 2009 15:30)

É...

É como uma cadência de samba, uma cena em câmera lenta, um sorvete que se toma num sol quente, um sorriso arregalado sem mão pra tapar. É estar contente com o azul do céu, brincar de poesia sem escrever, é pular de alegria sem ter por que, é xaxar sem ser Maria Bonita, é brincar de boneca sem ser criança, sem ser maricas, é voar com as asas dos pés, é comer pipoca em fim de tarde de domingo, é menino sambudo mexendo em areia, é sorriso de neném quando vê pisca-pisca no natal, é tomar a goles um refresco gelado, é dá um longo suspiro depois de correr desesperado, é gargalhar depois de ter chorado, é um adeus brincando pra quem ta do seu lado, é uma perna agoniada pra um maço de cigarro, é uma cama com molas pra quem tá cansado, é um ombro de afago pra quem quer chorar, é um lenço de papel pra quem quer fazer avião, é um livro pruma insônia, um batente pra um tropeção, uma visita batendo no portão, um presente no correio, uma carta de quem se gosta, uma passagem pra viajar, é um vento pra quem tem calor, é um beijo pra que tem amor, é um sim pra quem mais diz não.